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sábado, 12 de fevereiro de 2022

Agricultura regenerativa: o uso do sistema biológico como caminho para redução de custos e aumento da produtividade

 


Na década de 80, o agricultor americano Robert Rodale começou a estudar os processos de regeneração dos sistemas agrícolas ao longo do tempo e criou o termo “agricultura regenerativa”. De lá para cá, a adesão a esse sistema agrícola, que tem por base o uso do sistema biológico do agroecossistema, tem se mostrado o caminho para redução de custos e o aumento da produtividade.

Para falar sobre esse assunto, o Engenheiro Agrônomo, Agricultor de Rio Verde/GO, membro do Grupo Associado de Agricultura Sustentável (GAAS) e referência em agricultura regenerativa, Adriano Cruvinel, participou do “Encontro com Gigantes – Agricultura regenerativa: aprenda a trabalhar a lavoura como um sistema biológico”.

Qual é o princípio básico da agricultura regenerativa?

O princípio básico da agricultura regenerativa é implementar práticas agrícolas e de pastoreio que revertam as mudanças climáticas, reconstruindo a matéria orgânica do solo e restaurando a biodiversidade degradada.

É o que define a Regeneration International, organização sem fins lucrativos que promove a agricultura regenerativa.

Essa prática agrícola busca uma agricultura mais rentável, produtiva e sustentável, trazendo uma outra forma de abordagem dos agroecossistemas. Abordagem esta que trabalha todo o sistema biológico presente no campo como uma ferramenta a favor do agricultor, como ressalta Adriano Cruvinel:

“Nós precisamos trabalhar com toda a teia alimentar, juntamente com a parte química do solo, para que ela realmente funcione. Se pensarmos nos microrganismos do solo, nós precisamos oferecer materiais para que eles trabalhem e passem isso para as plantas, que vão retornar para o agricultor na forma de grãos. E por isso, é tão importante não utilizar práticas agressivas ao sistema biológico, como o Cloreto de Potássio (KCl) que é rico em cloro.”

Adriano Cruvinel  viu na agricultura regenerativa uma oportunidade para reduzir os custos da sua propriedade. Desde então, ele vem trabalhando com esse sistema de produção agrícola há 6 anos e percebeu que manejo regenerativo está trazendo novas possibilidades para o agronegócio da família.

Utilizando a tecnologia e referências profissionais do setor, ele conta que observou a constante evolução do seu sistema de produção a cada nova safra, com o aumento da produtividade e redução dos custos.

Redução esta que veio da economia com ações como:

  • A economia na aplicação de quase 35 mil litros/kg de inseticidas e fungicidas e aproximadamente 50 toneladas de fertilizantes químicos;
  • A redução no uso de mais de 80% dos produtos tóxicos ao meio ambiente;
  • A substituição dos fertilizantes convencionais por fontes de nutrientes que favorecem o sistema biológico do solo.

“Com os resultados que eu tive na primeira safra usando K Forte®, em substituição ao KCl, obtive a redução do custo, aumento da produtividade e ainda a não adição do cloro (água sanitária) no solo. Esse diferencial que o K Forte® trouxe nos proporcionou uma redução de custos de cerca de 62% na safra 21/22 em relação à safra 15/16, com média produtiva de 81 sacas/ha”, mencionou Adriano Cruvinel

Mas, como trabalhar a agricultura regenerativa na fazenda?

O trabalho com a agricultura regenerativa na prática

Adriano Cruvinel explica que um dos primeiros passos para se trabalhar com a agricultura regenerativa consiste na busca por referências profissionais e parceiros na área. Mesmo assim, ainda é necessário muito trabalho de toda a equipe envolvida para alcançar os resultados no longo prazo.

No caso da sua propriedade, ele menciona que até hoje já foram realizados mais de 60 ensaios na busca das melhores práticas e refinamento das técnicas para a realidade das suas lavouras:

“Para criar o sistema biológico, nós traçamos objetivos e diretrizes até 2030, que vêm sendo inseridos e testados de pouco a pouco na fazenda. Quando começamos, tínhamos ainda muito poucas referências para o que propúnhamos. Mas hoje, em cerca de 3 a 4 anos, você já consegue respostas bem positivas ao adotar a agricultura regenerativa praticando todos os seus princípios.”

Nesse percurso, também é importante que o agricultor conte com algumas ferramentas para monitoramento, tomada de decisão e implementação das técnicas mais adequadas. Para Adriano Cruvinel, o uso de dronesanálises foliares e químicas georreferenciadas e uso de biológicos foram práticas essenciais para a evolução das suas lavouras.

Dentre os diversos produtos biológicos inoculados na lavoura, ele destacou o uso de fungos e bactérias benéficas, como:

“Para a biologia nos mostrar o seu real potencial, ela também precisa da construção da parte química e física do solo. As análises químicas georreferenciadas, por exemplo, são uma base essencial para saber o que precisa ser incorporado ao solo para uma melhor resposta da lavoura”, ressaltou Adriano Cruvinel

Além disso, as práticas preventivas podem fazer muita diferença, principalmente no manejo de pragas e doenças.

Por exemplo, em um intervalo de quase 3 meses, mais de 6000 mil mariposas foram capturadas por armadilhas no entorno da propriedade de Adriano Cruvinel, evitando a disseminação de aproximadamente 2 milhões de lagartas na lavoura.

Por fim, Adriano Cruvinel concluiu ressaltando a importância do planejamento à longo prazo e de como os princípios da agricultura regenerativa podem trazer resultados surpreendentes:

“A nossa geração é a que mais grita por milagres, porque é a que mais quebra princípios. Quem quebra princípios, se torna mendigo de milagres. Agora quem pratica princípios, não precisa de milagre. É mais difícil, é mais trabalhoso, mas os resultados são melhores.”

Fonte: Blog Verde

quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Cultivo de feijão: cuidados na fase de implantação da lavoura

Um dos cultivos de maior importância econômica, cultural e social, o feijão está difundido por todo território brasileiro, sendo o terceiro grão mais plantado (em ha), atrás apenas da soja e do milho. Independente da variedade ou cultivar, o cultivo de feijão é conhecido por sua complexidade de manejo, especialmente em regiões de agricultura intensiva, com temperaturas amenas e elevada umidade relativa do ar, fato que favorece o desenvolvimento de doenças na cultura.

Considerada uma cultura sensível a pragas, doenças e condições ambientais, certos cuidados são necessários na fase de implantação da lavoura de feijão para a obtenção de altas produtividades do grão. Fatores como clima, fertilidade do solo, cultivar, hábito de crescimento, sistema de produção e resistência a pragas e doenças devem ser levados em consideração no início da implantação da lavoura.

O cuidado com todos esses pontos são fundamentais para garantir um adequado estande de plantas, estabelecimento da lavoura e rentabilidade do cultivo, contudo, tanto pragas quanto doenças devem receber atenção especial durante o ciclo de desenvolvimento do feijoeiro. Independente da época de semeadura do feijão, 1ª safra 2ª safra ou 3ª safra deve-se estabelecer certos cuidados nos estádios iniciais da lavoura.

Condições de elevada umidade do solo além de prejudicar o estabelecimento da lavoura favorecem o desenvolvimento de doenças fúngicas a exemplo da Fusariose. Popularmente conhecida como Podridão-radicular-seca (Fusarium solani) essa doença causa lesões no colo da planta, podendo causar destruição das raízes primárias impossibilitando a absorção de água e nutrientes do solo, refletindo na morte de plantas e redução do estande (Wendland; Lobo Junior; Faria, 2018) .

Figura 1. Sintomas típicos de Podridão-radicular-seca (Fusarium solani) nas raízes de feijoeiro-comum.


Foto: Murillo Lobo Junior

Doenças como a Antracnose (Colletotrichum lindemuthianum), e a Podridão-radicular de Rhizoctonia solani também são comuns em algumas áreas de produção do feijão nos estádios iniciais do estabelecimento da cultura. No caso da Antracnose, o patógeno é capaz de infectar as sementes, provocando sintomas como a formação de pequenas lesões escuras nos cotilédones e lesões superficiais ou deprimidas no hipocótilo. Já a Rhizoctonia solani, quando a infecção ocorre no estágio de plântula, o fungo produz lesões deprimidas de forma irregular, com a cor castanho-avermelhada na base do caule, que resultam em morte de boa parte do sistema radicular e/ou tombamento das plântulas (Wendland; Lobo Junior; Faria, 2018).

Dentre as possíveis práticas de manejo para controle dessas doenças, podemos destacar o uso de sementes certificadas (livre de patógenos e de boa qualidade física, fisiológica, genética e sanitária), a semeadura e implantação da cultura em áreas bem drenadas, a boa e velha rotação de culturas e principalmente, o tratamento de sementes com fungicidas específicos para o controle dessas doenças.

Figura 2. Sintomas de Antracnose em plântulas de feijoeiro-comum.


Foto: Adriane Wendland

Além da alta suscetibilidade a doenças, pragas iniciais também são problema para o cultivo de feijão. Insetos como o Gorgulho-do-solo (Teratopactus nodicollis); coros, lagarta-rosca (Agrotis ipsilon); Lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus), Spodoptera (Spodoptera frugiperda) e larva-alfinete (Diabrotica speciosa) podem causar sérios danos a plântulas de feijão. Os danos variam em função das pragas, mas pode ocorrer desde destruição das raízes da plântula a seu corte a nível do solo.

Figura 3. Danos de Spodoptera frugiperda em plântulas de feijão.

Foto: Eliane D. Quintela

Dentre as principais consequências do ataque de pragas no início do desenvolvimento da cultura podemos destacar a redução do estande de plantas, implicando diretamente no número de plantas por metro quadrado. Além dessas, outra praga que causa sérios danos a cultura é a Mosca-branca (Bemisia tabaci). Considerada uma praga sugadora, seus principais danos não estão relacionados a sucção de seiva das plantas, mas sim a transmissão do vírus do mosaico-dourado “Bean Golden mosaic virus” e mais recentemente observado o carlavírus “Cowpea mild mottle virus”. Os danos são mais significativos quanto mais jovem a planta for infectada pelos vírus, podendo ocorrer perda total da produção (Quintela & Barbosa, 2015).

Assim como para o controle de doenças de início de ciclo do feijão, o tratamento de sementes exerce significativo efeito para o controle de pragas iniciais, sendo assim, deve-se aliar ao tratamento de sementes com fungicidas, inseticidas para controle dessas pragas. Além do uso desses produtos no tratamento de sementes, é fundamental atentar para a qualidade desse tratamento.

Além de todos esses cuidados citados anteriormente (sementes de qualidade, tratamento de sementes, controle de pragas e doenças…), deve-se atentar para a profundidade de semeadura e distribuição de sementes para o cultivo do feijão, utilizando populações adequadas, com base nas recomendações técnicas da empresa detentora da tecnologia (produtora da semente). Elevadas profundidades de semeadura podem dificultar a emergência das plantas de feijão, retardando o estabelecimento da lavoura. A recomendação geral é utilizar 3 a 4 cm de profundidade em solos argilosos ou com umidade adequada, e, 5 a 6 cm em solos arenosos, em virtude da evaporação (perda) de água mais rápida, especialmente em sistemas sem palha na superfície. Em plantio realizado com solo frio, deve-se optar por profundidade de 3 a 4 cm (Comissão Técnica Sul-Brasileira de Feijão, 2012).

Figura 4. Emergência de plântula de feijão.


Fonte: Agroclima by Climatempo

Outro fato importante sobre o cultivo de feijão, deve-se atentar para o manejo e controle de plantas daninhas, uma das principais estratégias é realizar a implantação da lavoura “no limpo”, especialmente se tratando de lavouras sob sistema de plantio direto. A estratégia favorece o estabelecimento da cultura, antes que ocorra mato competição com plantas daninhas, mas atenção, é essencial identificar as principais espécies de daninhas presentes na área de cultivo, visando determinar o período ideal para controle delas sem que ocorram interferências na produtividade do feijoeiro.

No sistema plantio direto, o uso abundante de palhada residual auxilia no controle de plantas daninhas, atuando especialmente nos fluxos de emergência de espécies fotoblásticas positivas, as quais necessitam de luz para emergir. Como visto anteriormente, uma série de fatores podem intervir no estabelecimento da lavoura de feijão, sendo assim o cuidado com a lavoura nos estádios iniciais do seu desenvolvimento é indispensável para a obtenção de adequadas populações de plantas e boa produtividade da lavoura.

Fonte: Stoller


quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Mapa registra 31 defensivos agrícolas genéricos, com quatro produtos biológicos

 

Com a publicação, 2020 soma 60 produtos de baixo impacto registrados. Esse é o maior número de registros de produtos desse perfil em um mesmo ano. - Foto: Wenderson Araujo/CNA

Ato n° 55 do Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas da Secretaria de Defesa Agropecuária, publicado nesta quarta-feira, 23 de setembro, no Diário Oficial da União, traz o registro de 31 defensivos agrícolas formulados. A publicação divulga quais foram os produtos formulados que foram registrados e efetivamente estarão disponíveis para uso pelos agricultores.

Todos os produtos utilizam ingredientes ativos já registrados anteriormente no país. "Os novos registros são importantes pois diminuem a concentração do mercado de defensivos e aumentam a concorrência. Isso acaba resultando em um comércio mais justo e em menores custos de produção para a agricultura brasileira", explica o coordenador-geral de Agrotóxicos e Afins, Bruno Breitenbach.

Dos produtos registrados hoje, quatro deles são compostos por microrganismos como a Beauveria bassiana, o Bacillus thuringiensis, o Metarhizium anisopliae e o vírus Spodoptera frugiperda multiplenucleopolyhedrovirus que são agente biológicos de controle de pragas que atacam os cultivos brasileiros. Os produtos poderão ser utilizados em qualquer cultura em que forem encontradas as pragas para as quais esses agentes biológicos possuem recomendação de controle. Dois desses produtos poderão ser utilizados nas produções orgânicas certificadas.

Com a publicação, 2020 soma 60 produtos de baixo impacto registrados. Esse é o maior número de registros de produtos desse perfil em um mesmo ano.

Os produtos que utilizam agentes de controle biológicos são alternativas de controle para os agricultores no combate às pragas, ao mesmo tempo que contribuem para o aumento da sustentabilidade da agricultura nacional. 

Do total de produtos registrados e divulgados hoje, alguns contém mais de um ingrediente ativo. A maioria dos ingredientes ativos registrados já têm registros nos Estados Unidos, na Europa e na Austrália. 

Todos os produtos registrados foram analisados e aprovados pelos órgãos responsáveis pela saúde, meio ambiente e agricultura, de acordo com critérios científicos e alinhados às melhores práticas internacionais.

Fonte: Grupo Cultivar

sábado, 12 de setembro de 2020

Como evolui a adoção de controle biológico para manejo de pragas no Brasil

 

Tendência mundial, o controle biológico tem crescido ao longo dos anos no Brasil, especialmente como parte do manejo integrado de pragas.

Quando se fala em controle de pragas no Brasil, o agricultor, de um modo geral, pensa em agroquímicos. É uma “cultura” arraigada no brasileiro que sempre foi difícil de mudar. É um tipo de controle que vem sendo utilizado desde 1939, após a descoberta das propriedades inseticidas do DDT por Paul Müller, pesquisa que lhe rendeu um prêmio Nobel. A partir daí, criou-se uma “cultura familiar” de que todos os problemas agrícolas seriam resolvidos com o uso de agroquímicos. Por mais que se fale em alternativas de controle, o agricultor brasileiro gosta de aplicar um produto químico e ver a praga morta no solo. A Entomologia Econômica brasileira nasceu e cresceu com base em métodos químicos.

Entretanto, são claros os resultados negativos decorrentes de uma aplicação inadequada de produtos químicos. Devido à ocorrência crescente de problemas, começaram a surgir pesquisadores preocupados em resolvê-los; entre eles, destacou-se a bióloga Rachel Carson, que em 1962 publicou o livro Primavera Silenciosa (Silent Spring) que chamava, de forma contundente, a atenção para as consequências da utilização incorreta dos produtos químicos. Seguiram-se outros trabalhos e no final da década de 1960 surgiram pesquisas com a filosofia de Manejo Integrado de Pragas (MIP), que previa a utilização de um conjunto de medidas para manter a população das pragas abaixo do nível de dano econômico, levando-se em conta critérios econômicos, ecológicos e sociais.

Assim como as plantas, todo animal possui seu agente de controle biológico
Assim como as plantas, todo animal possui seu agente de controle biológico

Alguns pesquisadores americanos se destacaram, dentre eles Marcos Kogan, brasileiro radicado na Universidade de Illinois, EUA, que transferiu a tecnologia para a soja, que estava em plena expansão no Brasil, o que fez com que esta cultura fosse uma das primeiras a utilizar o MIP no País.

Como parte do conjunto de medidas que compõe o MIP, o Controle Biológico, ocupa, ao lado de feromônios, métodos culturais, plantas transgênicas etc., lugar de destaque, sendo que os químicos, desde que adequadamente utilizados, podem ser incluídos, como produtos seletivos que matam as pragas, mas não os inimigos naturais.

O Controle Biológico como técnica aplicada teve seu início com a introdução da joaninha australiana (Rodolia cardinalis) para controlar o “pulgão branco” do citros em pomares na Califórnia. Os estudos que culminaram com essa introdução foram desenvolvidos na universidade daquele estado americano, considerado o berço do Controle Biológico moderno. Esta mesma universidade realizou em 1989, em Riverside, um simpósio para comemoração do centenário da primeira introdução bem-sucedida de um inimigo natural para controle de uma praga.

No entanto, a ação de inimigos naturais para controle de pragas já é conhecida desde a antiguidade, pois antes de Cristo, os chineses transportavam colônias de formigas predadoras para controle de lagartas em citros. Controle Biológico (CB) pode ser tecnicamente definido como “fenômeno natural que consiste na regulação de plantas e animais por organismos vivos, chamados agentes de mortalidade biótica”. Toda planta e todo animal possuem seu agente de Controle Biológico.

Inimigos naturais têm papel importante no manejo de pragas
Inimigos naturais têm papel importante no manejo de pragas

Mas o homem, nos primórdios das humanidade, desequilibrou o sistema, que estava todo em harmonia, para obtenção de alimentos em larga escala, fazendo com que, atualmente, por exemplo, grandes áreas contínuas de soja, arroz, feijão etc. fossem plantadas. Ao lado disso começaram as aplicações indiscriminadas de produtos químicos, intensificando o desequilíbrio.

O que preconiza atualmente é utilizar o CB, não necessariamente isolado, mas em muitas culturas, como parte do MIP, para reequilibrar o sistema.

Existem diferentes agentes de Controle Biológico, que podem ser divididos em macro e micro-organismos. Didaticamente pode-se dizer que o primeiro grupo corresponde àqueles que podem ser vistos a olho nu, como insetos e ácaros. Já os micro são aqueles visíveis apenas em microscópios e são compostos por fungos, vírus, bactérias, nematoides etc.

Todos, sejam macro ou micro-organismos, demandam tecnologia para sua produção com qualidade e em larga escala. No caso dos macros, o maior gargalo é a automação de produção do agente de controle biológico, pois, atualmente, de 70% a 80% do custo de produção destes agentes de controle se deve à mão de obra. Já no caso dos micros, o fator de maior importância é a formulação.

Na prática, o agricultor dá preferência aos micro-organismos, pois são mais semelhantes, na aplicação, aos químicos, tendo ainda um “tempo de prateleira” (shelf-life), ou seja, você pode comprar uma caixa de um produto contendo um fungo e utilizá-lo dentro de alguns meses. Isto não ocorre para macro-organismos, pois devem ser produzidos e liberados, caso contrário, os agentes biológicos morrem em pouco tempo.

O Brasil é um produtor de “commodities” e, portanto, um grande exportador. Para continuidade deste “status” é fundamental a adoção de práticas como o Controle Biológico, pois os mercados internacionais vêm exigindo, cada vez mais, produtos sem resíduos. Sustentabilidade é a palavra “mágica” hoje em dia. E restrições, inclusive políticas, tendem a aumentar cada vez mais para atender a essa sustentabilidade.

O Brasil tem um tipo de agricultura que não é fácil para se fazer Controle Biológico, pois são grandes áreas e com plantios sucessivos de diferentes culturas. As pragas se sucedem e aumentam sua população local sem precisar migrar para outras culturas.

Então, assim como o País é líder em Agricultura Tropical, pode se tornar líder em Controle Biológico para regiões tropicais. Este é o grande desafio: desenvolver um modelo de CB adequado às condições tropicais, pois grande parte das estratégias de CB foi desenvolvida para cultivos protegidos, como na Europa.

Portanto, não dá para, simplesmente, copiar modelos de outros países. É preciso desenvolver um programa próprio para a agricultura brasileira em campos abertos (open fields), em que um único agricultor planta milhares de hectares de uma única cultura (milho, soja etc.).

É preciso para aumentar a utilização do CB, mudar a “cultura do agricultor”. E para isto, é necessário divulgar o que realmente é o Controle Biológico. Existem ainda muitos mitos (Parra, 2019). O principal deles é que essa “cultura” do agricultor não pode ser mudada; outro é de que o CB é “coisa fácil”; que o custo deve ser mais barato que o controle químico (sem considerar as vantagens ecológicas e sociais); que é um método a longo prazo (baseando-se no início do CB, onde não existiam técnicas de criações massais de insetos e que, portanto, os insetos tinham de se multiplicar na cultura, pois eram liberados em pequenas quantidades e desse modo só serviriam para culturas perenes ou semiperenes) e que o CB seria a solução única e não parte de um programa de MIP, atualmente preconizado.

A facilidade mencionada como mito pode levar a fracassos, principalmente para micro-organismos, cuja produção, se não realizada de forma criteriosa, tende a levar a problemas de contaminação do produto e a uma baixa eficiência.

A “cultura” felizmente está mudando, pois no ano passado o CB movimentou cerca de R$ 500 milhões no mercado brasileiro, valor ainda pequeno se comparado aos químicos. Mas o aumento desta movimentação virá com a mudança da “cultura”. E há um marco para esta grande mudança. Em 2013, foi encontrada, pela primeira vez no Brasil, Helicoverpa armigera, praga com mais de 200 hospedeiros que ataca algodoeiro, soja, citros, milho etc. À época não existia nenhum produto químico registrado para a praga. E o agricultor teve que usar um vírus já comercializado em outros países e o Trichogramma pretiosum como parasitoide de ovos. Ambos funcionaram muito bem! Pena que a oferta destes insumos não atendeu a todos os interessados na época. Essa mudança vem acompanhada do surgimento de pequenas empresas de CB, como (startups) (Bug Agentes Biológicos e Promip, ambas saídas da USP/Esalq, por exemplo) e de grandes, como a Koppert, maior empresa de CB do mundo que entrou no País em 2010. Atualmente, quase todas as empresas de químicos têm um produto biológico no seu portfólio.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) tem um programa de incentivo às pequenas empresas (Pipe). Um grande número de startups de CB (cerca de 15) começou a aparecer. O aumento da oferta dos insumos biológicos permitirá o incentivo da utilização desta técnica de controle.

São ainda poucos os produtos registrados no Brasil em relação aos 440 existentes no mundo. É interessante lembrar que já existiam empresas de CB no Brasil desde a década de 1980 em Alagoas (Biotech), posteriormente a Biocontrol (Sertãozinho-SP), entre outras, ao lado de laboratórios de usinas de cana-de-açúcar e laboratórios independentes produzindo parasitoides para o controle da broca da cana (Diatraea saccharalis).

O que se faz em CB com macro-organismos é a liberação de uma grande quantidade de insetos ou ácaros para controle da praga. Portanto, há necessidade de domínio de técnicas de criação de dois insetos: a praga e o inimigo natural, às vezes com dietas artificiais que substituem o alimento natural para a praga. Este é o Controle Biológico Aumentativo (também chamado de Aplicado), que tem um efeito rápido sobre a praga, como os inseticidas, e é mais aceito pelo agricultor. Como são grandes áreas, há necessidade de se produzir grandes quantidades de insetos, que, muitas vezes, demandam sistemas automatizados. Existem outros tipos de CB para áreas menores, como o método de CB Clássico, que usa um inimigo natural exótico, liberando-se pequenas quantidades, e o resultado vem a longo prazo, porém é duradouro, servindo para culturas perenes e semiperenes. E o CB Conservativo, que é mais para pequenas áreas e tem por objetivo manter e, se possível, aumentar os inimigos naturais que já existem na área (aliado a outras técnicas como uso de produtos seletivos e manejo da resistência).

E mais recentemente foi referido um novo procedimento em CB. O Manejo Externo (Diniz et al., 2019), em que o inimigo natural é liberado fora do local de cultivo (onde se deseja a redução da praga), e é utilizado para pragas transmissoras de doenças como o psilídeo dos citros (Diaphorina citri), que é vetor das bactérias causadoras do Huanglongbing (HLB) ou Greening. Neste caso, o inimigo natural, o parasitoide (Tamarixia radiata) é liberado fora dos pomares comercias em locais onde há o foco da doença (nos quais os insetos contaminados se reproduzem), como pomares abandonados, orgânicos, áreas com murta (hospedeiro do psilídeo), fundos de quintal ou ainda áreas sem aplicação de inseticidas.

O Brasil tem uma grande diversidade que pode ser explorada, tanto de macro quanto de micro-organismos. Estes micro-organismos já vêm sendo bastante utilizados, milhões de hectares são atualmente tratados com Trichoderma harzianum (fungo para controle de doença, mas também como nutriente para plantas), Metarhizium anisopliae, Beauveria bassiana, Bacillus thuringiensis, B. subtilis, Cordyceps fumosoroseus etc. para controle de cigarrinhas da cana, das pastagens, broca do café, mosca-branca, lagartas de modo geral e psilídeo dos citros, entre outros. Os vírus específicos são comercializados para diversos lepidópteros, e os ácaros para olerícolas e flores.

Dentre os macro-organismos, a cana-de-açúcar é a cultura onde se aplicam mais medidas de CB: para o controle da broca é utilizado o parasitoide larval Cotesia flavipes em mais de três milhões de hectares e o parasitoide de ovos Trichogramma galloi em mais de dois milhões de hectares.

A espécie Trichogramma pretiosum vem sendo utilizada em algodoeiro e soja para lepidópteros, em abacateiro para Stenoma catenifer, em tomateiro para Tuta absoluta, em tabaco para Phthorimaea operculella.

Outros parasitoides vêm sendo utilizados para controle do percevejo-marrom da soja (Euschistus heros), no caso, Telenomus podisi; T. remus e/ou Trichogramma pretiosum para controle de Spodoptera frugiperda com muitos outros agentes potenciais e em estudos em diferentes culturas. Em todos, dependendo, ainda, de uma maior produção e oferta dos parasitoides e de predadores ao agricultor.

Uma lista de inimigos naturais utilizados no Brasil é apresentada na Tabela 1.

Os avanços do CB são evidentes no Brasil com o aumento de massa crítica de interessados em estudar o tema, formados nos últimos anos em cursos de pós-graduação. Esta é atualmente uma tendência mundial, pois há um anseio por uma agricultura sustentável em curto espaço de tempo.Portanto, há necessidade de investimentos, formação de recursos humanos e organização em torno do CB.

Existiu até 2019 a Associação Brasileira de Controle Biológico (ABCBio), que concentrava as empresas que definiam as diretrizes sobre o assunto no Brasil. Recentemente esta associação foi incorporada pela CropLife que, de modo geral, é relacionada à proteção de cultivos.

Investimentos começam a surgir. As grandes empresas de agroquímicos concentram esforços para terem produtos biológicos no seu portfólio. O governo começa a investir, havendo um grande programa de biocontroladores desenvolvido na Esalq, e apoiado pela Embrapii, ligado ao INCTI e ao pesquisador Ítalo Delalibera.

Em fevereiro foi lançado o SPARCBio, Centro de Excelência de CB, no qual há uma parceria entre a Universidade de São Paulo (USP), a Fapesp e a empresa Koppert Biological Systems.

O SPARCBio tem sede no Departamento de Entomologia e Acarologia da Esalq/USP e desenvolverá trabalhos desde a prospecção de novos agentes até a incorporação do CB em programas de MIP (Figura 1).

Figura 1 - Principais linhas de pesquisa do SPARCBio
Figura 1 - Principais linhas de pesquisa do SPARCBio

Além da importância da pesquisa, este Centro, que possui coordenação do professor José Roberto Postali Parra, procurará difundir o CB em diferentes níveis, desde o pré-universitário, o universitário, a pós-graduação e obviamente até o agricultor.

É óbvio que ainda há desafios, citados por Parra (2014), incluindo além da mudança da cultura do agricultor, problemas com a transferência de tecnologia ao campo; monitoramento de pragas, oferta dos insumos biológicos (necessidade de surgimento de mais empresas na área); qualidade do material biológico disponível, logística de armazenamento e transporte (considerando-se a extensão territorial do país); legislação própria e mais adequada; tecnologia de liberação, entre outros. Uma vez que a nova agricultura é muito dinâmica e envolve extensas áreas com transgênicos, estas deverão conviver, da melhor forma, com produtos biológicos.

Estes obstáculos começam a ser transpostos em alguns itens como a liberação de macro-organismos e monitoramento de pragas e o agricultor está se adaptando à Agricultura 4.0. Assim, em cana-de-açúcar, das áreas tratadas com T. galloi (> 2 milhões de hectares) 91% das liberações do parasitoide são feitas com uso de drones. Paralelamente, estudos com equipamentos adaptados aos drones permitirão a amostragem de pragas, para liberação de agentes de controle, com uso de sensoriamento remoto.

O Brasil avança, entretanto, para que a sociedade não seja desapontada, os estudos de CB envolvem diferentes etapas e para tal desenvolvimento. Às vezes são necessários alguns anos, como o caso de Trichogramma, que exigiu 15 anos com pesquisas inter e multidisciplinares envolvendo desde a prospecção do agente de controle biológico, sua taxonomia, até avaliação do custo- benefício para sua oferta ao agricultor (Figura 2).

Figura 2 - Etapas para desenvolvimento de um programa de Controle Biológico completo
Figura 2 - Etapas para desenvolvimento de um programa de Controle Biológico completo

Há estudos sendo iniciados em muitas áreas, e os desafios para regiões tropicais em “campos abertos” são diferentes de tudo o que já foi feito no mundo. Portanto, o grande desafio é desenvolver um modelo de CB para regiões tropicais feito com muito critério e ciência.

José Roberto Postali Parra, Alexandre José Ferreira Diniz e Aloísio Coelho Júnior, USP/Esalq

Fonte: Grupo Cultivar 

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